Com mais de duas décadas, ECA nunca foi cumprido da forma adequada
Análise é de advogados contrários à reformulação da legislação
Brasil e Mundo 16/07/2016 11h30

Por Will Rodriguez

Na semana em que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 26 anos, um cobrador foi assassinado por um adolescente de 17 anos durante um assalto a ônibus em Aracaju (SE). O tiro que matou David Jonathan Barbosa, 26 anos, feriu também a sociedade sergipana, que ficou ainda mais apavorada com o avanço da violência no transporte público. Ao ser apreendido, o menor que atirou no trabalhador disse à Polícia que estava com o revólver porque era o único com menos de 18 anos no trio.   A inevitável sensação de impunidade reacende o debate sobre a eficácia do ECA  na responsabilização de adolescentes que cometem atos infracionais. Especialistas em direito, ouvidos pelo F5 News, são unânimes em defender a legislação, mas apontam que, apesar de não ser tão recente, ela nunca foi cumprida como deveria. “Não podemos condenar o estatuto porque nunca o experimentamos, a maior parte do que está posto não foi aplicado ainda”, avalia o advogado criminalista Aurélio Belém.

O advogado Thiago Noronha observa que o ECA serviu para reforçar os direitos da criança e do adolescente que já estavam previstos pela Constituição. “Ele tem ferramentas não só para garantir os direitos, mas também criar uma rede de proteção para esse cidadão em formação”. O problema é que, invariavelmente, essa rede funciona de forma deficiente. “Há uma série de problemas que vem de berço, falta de assistência do Estado, que acarretam nessas questões absurdas de atos infracionais praticados por eles”, considera.

O menor que atirou no cobrador é acusado pela Polícia de cometer pelo menos outros sete assaltos a ônibus. Há menos de dois meses, ele já tinha sido apreendido por depredar uma viatura policial. Ressocialização e reincidência traçam curvas opostas. Como a segunda cresce bem mais que a primeira, a redução da maioridade penal foi apontada como alternativa. Mas o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/SE), Henri Clay Andrade, é enfático ao defender que a medida vai tapar o sol com a peneira. “É uma ingenuidade, quem entende de segurança sabe que não funciona. É uma cilada para tangenciar o que está posto, um estado total de insegurança em todos os setores da sociedade”, assegura.

Esse entendimento é corroborado pelo presidente da Comissão dos Direitos Humanos da OAB, Thiago Oliveira, que culpa ainda a falta de vontade política para estancar a sangria da criminalidade. Segundo ele, afirmar que o ECA não prevê responsabilização para adolescentes em conflito com a lei é uma falácia. “O Estado não faz a parte dele, e coloca a culpa da insegurança na perspectiva de uma lei que, diga-se de passagem, não foi cumprida até agora. É interessante para quem governa fazer com que as nossas futuras gerações sejam escolarizadas, tenham pensamento próprio, capaz de refletir e fiscalizar os governos?”, questiona o advogado.

O especialista em Direito Penal Aurélio Belém vai além. Para ele, a redução da maioridade penal não apenas desprotege crianças e adolescentes ferindo os avanços propostos pelo ECA, mas deve gerar marcas ainda mais severas na segurança pública. “[a redução] só colocaria mais gente dentro de um sistema prisional falido, no qual o Estado é incapaz de aplicar aquilo que está posto na Lei de Execuções Penais, que é de 1984. É tapar o sol com a peneira, desviar o rumo da discussão e assolar ainda mais um sistema falido”, acredita.

Para quem está do outro lado da ponta e apreende dezenas de menores todos os dias, a sensação é de que a Polícia enxuga gelo. Para o delegado André Baronto, a proteção que a Lei oferece a adolescentes infratores é sintomática de um problema que não pode mais ser postergado. “A legislação precisa de revisão”, afiança.

Já para o advogado Ariel de Castro Alves, membro da coordenação estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos, a redução seria a decretação da completa falência dos sistemas educacionais e de proteção social do País. “O crime só inclui quando o Estado exclui”, pondera. 

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