Sagrado Feminino: como mulheres restauram forças através do autoconhecimento
Estilo de vida oferece ensinamentos sobre ciclos femininos e como harmonizá-los Cotidiano | Por Laís de Melo 08/03/2021 07h46Diante das cobranças do mundo contemporâneo, onde a mulher é responsável por múltiplas jornadas - trabalho, filhos, casa -, o “chamado” para o autoconhecimento, auto amor e autocuidado tem pulsado com mais intensidade para muitas mulheres. Essa busca por reconexão tem um nome e é conhecida como “Sagrado Feminino”.
Esse é um dos assuntos mais discutidos nos últimos anos. Segundo dados da empresa Amazon, entre os livros mais vendidos de 2020, o segundo colocado foi “Mulheres que correm com os lobos”, de Clarissa Pinkola Éstes. Lançada há quase três décadas e, de maneira atemporal, fala sobre mitos e histórias do arquétipo da mulher selvagem. No universo do “Sagrado Feminino” ele pode ser considerado uma bíblia para aquelas que buscam autoconhecimento, reconexão e cura interior.
Nesta segunda-feira (8), quando o mundo celebra o Dia Internacional da Mulher, em meio a tantos alertas e homenagens que podem ser feitos, por quê não falar sobre o Sagrado Feminino? Afinal, segundo terapeutas holísticas e psicoterapeutas, trabalhar o sagrado que há em cada mulher é uma forma de empoderá-la.
A terapeuta sergipana Chalaina Silvia Anjos explica que “o movimento contemporâneo estimulou a mulher a retornar para padrões patriarcais”, onde foram obrigadas a deixar de lado a feminilidade e assumir comportamentos masculinos para se manterem inseridas no mercado de trabalho e aceitas na sociedade. No entanto, ao assumir um comportamento que vai de encontro com o ritmo fisiológico feminino, os problemas começam a surgir, conforme aponta Silvia.
“O ritmo hormonal dos homens é mais constante, e não tem tanta oscilação. Já o ritmo feminino é um ritmo cíclico, e num único mês nós oscilamos pelo menos quatro vezes hormonalmente. Mas, a construção de uma sociedade produtiva, com crescimento das indústrias, trouxe um funcionamento que negava todo esse ciclo feminino. A mulher, para se colocar no mercado de trabalho não podia mostrar os seus ciclos, ela tinha que anestesiá-los, através dos anticoncepcionais, para que não tivesse alteração de humor, e tinha que entrar no ritmo masculino, que é mais estável hormonalmente. Com essa negação do feminino, no mundo contemporâneo, vemos muitas mulheres adoecendo, tendo patologias”, diz Silvia.
E é justamente essa busca pelo resgate da força feminina, baseada no respeito aos próprios ciclos, que foram negados ao longo da história, onde habita o Sagrado Feminino.
“Chamar o feminino de sagrado, é como trazer um lugar de percepção e de reconhecimento. No mundo contemporâneo quando a mulher começa a adoecer por causa dessa rotina de trabalho exacerbada, acelerada, dentro de um padrão que é muito mais do corpo masculino do que do corpo feminino, começa a acontecer um resgate e muitas mulheres começam a estudar sobre essa fisiologia e sobre essa natureza. E a partir disso começam a surgir rodas, jornadas de resgate, e aí sim se dá o nome de sagrado”, acrescenta a terapeuta.No sagrado feminino também se fala muito sobre ancestralidade, e isso acontece porque a negação do feminino não é algo recente, acompanha mulheres através das gerações, e por isso, o movimento acredita que, a mulher contemporânea deve olhar o antepassado e honrá-lo..
“Se eu for pegar minha história, talvez com minha bisavó já existiam dores e sofrimentos de não poder ser vista, ou de só poder estar numa função que era de cuidar dos filhos e da casa. Quando falamos de reconexão, falamos de olhar para a nossa ancestralidade e conectar com as potências para curar essas dores. Uma via é comigo mesma, quando aprendo sobre as minhas dores, limpezas e potências enquanto mulher, e a outra é olhar para quem veio antes, e para as memórias que recebo inconscientemente dos antepassados”, explica Chalaina.
O ano de 2020 foi um potencializador desta busca. Com a pandemia do novo coronavírus, e o isolamento social, muitas mulheres ficaram mais tempo dentro de casa, tendo que lidar com filhos e companheiros e, automaticamente, assumir ainda mais funções. Por exemplo, com as aulas presenciais suspensas, essa mãe também precisou auxiliar o filho nas aulas online, e tudo isso acarretou em mais sobrecarga, fazendo com que muitas procurassem ajuda psicológica e reconexão.
"Em muitas mulheres, a solidão que elas viviam se destacou, apesar de achar que não estavam só. Muitas vezes, elas percebiam que estavam assumindo todas as rotinas da casa, e que agora desse jeito, dessa rotina sem suportes, não conseguiriam lidar. Muitos casamentos começaram a ruir, e essa vontade de muitas mulheres de entender esses ritos internos e suas dores ancestrais começou a emergir mais forte", acredita Silvia.Segundo a terapeuta holística, escritora e líder da yoga do riso, Aline Soares Negrin, no ano de 2019 o planeta entrou na ‘Era feminina’. "Em 2020 essa Era se fortaleceu, então, energeticamente o planeta Terra, que é uma mulher e se chama Gaia, está passando por um processo também de receber mais energias femininas, então o planeta todo está recebendo um grande banho das energias femininas, bem como todos os seres vivos também", afirma.
Mas então o que, e como fazer, para se reconectar?
As mulheres podem realizar diversos tipos de rituais para trabalhar o Sagrado Feminino. Há um movimento que, segundo a psicoterapeuta Ana Priscylla Brito, pode ser trabalhado até mesmo dentro dos consultórios. "É feita uma análise se a paciente está com o feminino saudável ou adoecido, e a partir disso, vamos identificar quais caminhos e rituais poderemos fazer, ou ela própria, sozinha. Isso depende muito da paciente, se ela terá abertura ou não para isso", conta a profissional.
Ainda segundo Ana Priscylla, entre as diversas esferas ritualistas, existem aquelas que envolvem a força da lua. "Seria acompanhar como as fases da lua influenciam no nosso corpo, nas nossas energias, emoções e pensamentos, ou ainda como influenciam o nosso ciclo menstrual", explica.Ela cita também o ritual de plantar a lua, o que envolve não só o autoconhecimento feminino e o resgate ancestral, mas, a quebra do tabu com o sangue menstrual. "Nesse ritual nós colhemos nosso sangue menstrual e devolvemos para a terra. Com isso, nós nutrimos esta terra, tornando-a mais fértil. O objetivo é também nos conectarmos com o nosso sangue, que também é sagrado. Afinal, crescemos muito com a ideia de que a menstruação é um sangue sujo, e que devemos ter nojo ou vergonha. Então, o ritual é a forma de ver o sangue da nossa menstruação como material da nossa força, e que algo que é só nosso, só as fêmeas menstruam", ressalta Ana Priscylla.
A mulher também pode buscar reconexão com o sagrado feminino por meio da dança livre, um ritual onde é possível mexer o corpo sem a preocupação de ser julgada, conforme aponta a psicoterapeuta. Neste ritual, a mulher poderá estabelecer conexão com o feminino emocional e também físico.
Além disso, existem os rituais de autocuidado. "Tem banhos de ervas, escalda pés, chás, plantar e cuidar das plantas. São formas de se cuidar e voltar as atenções para nós mesmas, e ter um momento único de conexão também com a natureza. Há também a vaporização do útero, que consiste em sentar em cima de uma bacia com uma mistura de ervas e água quente, como uma espécie de chá, onde o vapor entra na nossa vagina, e vai limpando nosso canal, chegando até o útero e retira bloqueios, memórias de abusos, trabalha a libido, sexualidade e diversas outras coisas", complementa a psicoterapeuta.Os caminhos podem ser diversos, e Ana Priscylla reforça a importância de cada mulher fazer aquilo que se identifica. "Esses são alguns exemplos, mas, o mais importante é que a mulher procure o ritual que faça sentido para ela, que ela goste. É muito importante salientar que você não deixa de ser sagrada se não realizar alguns desses rituais", alerta.
O caminho do coração
O sagrado feminino, além de trazer reconexão à mulher, também pode ser a cura para doenças patológicas e psicoemocionais. "Ao soltarmos esses padrões e nos conectarmos com a energia do Sagrado Feminino, nos liberamos, em camadas, da desconexão, da sensação de vazio existencial, da angústia, da baixa auto-estima e, consequentemente, de relacionamentos abusivos. Manifestamos profunda conexão com nosso corpo, ritmos orgânicos e ouvimos suas mensagens. Aceitamos as fases de nossa vida e o envelhecimento. Temos um maior contato com os sentimentos e intuição, reconhecendo nossos talentos e realizando o nosso propósito divino aqui na Terra", reforça a terapeuta xamânica da Bahia, Nanci Sampaio.Ainda segundo ela, apesar de trabalhar a força feminina, o Sagrado Feminino independe de gênero. "Se trata da energia ligada ao caminho do coração: ao amor, ao respeito a si mesmo, ao outro e ao planeta em que vivemos. É estar em comunhão com o princípio feminino ou a deusa interior, acolhendo nossos instintos, insights, (re)conhecendo e conectando-se com nossos ciclos, com a Mãe Natureza, que é a manifestação do feminino, e com sua ancestralidade para viver em mais presença e em harmonia com seus corpos físico, mental, emocional e espiritual", conclui a terapeuta.





