Sem regulamentação, clandestinos circulam livremente na Grande Aracaju
Concorrência desestimula serviço formal que enfrenta baixa de passageiros e aumento de custos. Cotidiano | Por Fernanda Araujo e Will Rodriguez 21/02/2019 14h31 - Atualizado em 21/02/2019 14h50Próximo ao terminal de integração dos Mercados Centrais de Aracaju, dezenas de motoristas aguardam sob um sol escaldante em veículos com placas cinza. Para fazer a viagem, basta aguardar a chegada de mais um ou dois passageiros com o mesmo destino. Além dos táxis oficiais de cada município da região metropolitana, não é raro avistar carros particulares fazendo o serviço.
Apesar de considerado ilegal pela Legislação de Aracaju, o transporte no modelo semelhante ao táxi-lotação, com embarque em diferentes pontos e tarifa fixa, é visto com normalidade. Essa disputa clandestina afeta não só o transporte público regularizado, mas os próprios ilegais e o resultado, para além da concorrência desleal, é o prejuízo para as empresas oficiais e a queda da qualidade do serviço, cuja fiscalização deixa a desejar.
Na região metropolitana, pelos menos quatro cooperativas operam transportando passageiros de Nossa Senhora do Socorro, São Cristóvão, Barra dos Coqueiros, dos bairros. Eles possuem uma espécie de autorização especial para levar e trazer passageiros de suas cidades até a capital. De lotação, pontos estão concentrados no centro comercial da cidade, que levam a bairros como Santa Maria, Coroa do Meio, Jabotiana, Santos Dumont, Bugio e 18 do Forte, sem qualquer critério.
As cooperativas, táxis bandeira e lotações – este último sistema que existe há cerca de 30 anos – se tornaram opções para quem acredita que andar de ônibus está custando caro e não oferece conforto. Apesar de ser o mesmo preço da passagem de ônibus, a comodidade de estar em um veículo ‘particular’ é levada em consideração.
“O pessoal aceita muito porque está o mesmo preço da passagem de ônibus e tem a comodidade. Nós temos muita proximidade com os taxistas também. Prefiro usar as cooperativas a ficar apertado dentro de um ônibus cheio de gente”, diz Alexandre Lorenço, que é morador de Socorro.
Para a autônoma Viviane Alves, a agilidade dos veículos foi o que motivou a escolha. “São bastantes táxis, então fica mais rápido e facilita para eu vir pagar alguma conta aqui no Centro. Já o ônibus, às vezes, demora a chegar e para distante de onde eu moro”, relata.
Uma das cooperativas, a Coopertalso, por exemplo, oferece o serviço no trajeto Socorro até Aracaju. Ao todo, são 460 carros, entre verdes e amarelos. “Geralmente deixamos na Avenida principal (de Socorro), mas se a pessoa quiser ficar em casa, estiver com bagagem, paga mais uma passagem e a gente leva na residência”, conta o motorista Ramilton José Santos Cunha, que trabalha nesse sistema há oito anos.
“O táxi de lotação é uma riqueza para a população, com certeza. Eles oferecem conforto, um desempenho melhor, a população gosta. O sistema aqui ampliou os carros, eram quatro passageiros, agora são seis, a potência do veículo também melhorou, são 23 carros de lotação para o Santos Dumont”, acrescenta Damião Rodrigues Souza, motorista há 15 anos.
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Nos últimos anos, com a chegada dos aplicativos de transporte, esse segmento também viu sua demanda despencar - nas contas dos motoristas de lotação, pelo menos 30%. Somado a isso, eles também sentiram a crise econômica que afetou o poder de compra da população. “Pelo horário do trabalho a gente ia até 20h30, agora vai até 18h30, 19h”, diz Damião.
Apesar de circularem livremente, como não têm qualquer amparo legal, os lotações não regulamentados são alvo – ainda que de forma tímida - das fiscalizações da Superintendência Municipal de Transporte e Trânsito (SMTT) de Aracaju. No ano passado, o órgão emitiu 489 autuações (multas) a transportes clandestinos e 148 apreensões.
Ancorados na fragilidade do trabalho do Poder Público, os motoristas não perdem de vista que a melhor solução é a regulamentação. Contudo, há anos o assunto paira sobre a Câmara Municipal, mas até hoje foram poucos os movimentos no sentido de tentar resolvê-lo. A justificativa: incapacidade do município para comportar o acréscimo das concessões de táxi, de acordo com o Plano Diretor, revisado pela última vez em 2012. Nas ruas, a procura pelo lotação contraria o argumento.
“Eu acho que precisa controlar essa situação porque a gente tem o estacionamento nosso que a gente comprou, tem o lugar fixo da gente que todo mundo conhece, então a população aprova, só falta a questão do SMTT e do Estado”, afirma Ramilton Cunha.
“É preciso que esse serviço continue, a população precisa e é uma concorrência, então traz melhoria para a população no sistema de transporte”, argumenta Arlan Goes, motorista de lotação há dois anos.
A inércia do órgão de controle, contudo, não encontra respaldo junto ao Ministério Público, que moveu ações civis cobrando o ordenamento do serviço. Em uma delas, o MP conseguiu uma liminar que proíbe integralmente o funcionamento do transporte alternativo de lotação.
“Houve decisão final com sentença, estamos aguardando o cumprimento efetivo do que foi determinado pela Justiça. Já temos inclusive alguns inquéritos policiais em tramitação com a responsabilização criminal, porque é crime, um atentado ao serviço de utilidade pública, o exercício ilegal da profissão”, afirma a promotora de Defesa do Consumidor, Euza Missano.
A SMTT diz que faz fiscalizações constantemente, mas reconhece dificuldades para coibir de forma mais efetiva essa atividade, dentre outras razões, pela fácil disseminação dos clandestinos. “Não é fácil caracterizar o transporte irregular, pois eles usam placas cinza e não temos efetivo suficiente. Hoje, temos atuado com duas equipes diariamente em roteiros estratégicos”, afirma o diretor de Transporte Público, Augusto Magalhães.
Ao fazer o flagrante, os fiscais registram uma multa de R$ 957 e sete pontos na carteira de habilitação do condutor, sujeito ainda a sanções previstas no Código Brasileiro de Trânsito. Em seguida, o caso é notificado ao Ministério Público, responsável por cobrar a aplicação de multa diária de mil reais à cooperativa vinculada ao carro apreendido.
Ainda conforme o diretor da SMTT, por enquanto não há qualquer estudo no sentido de comprovar a demanda que justifique a ampliação das concessões de táxi, pleiteada por aqueles que atualmente rodam na clandestinidade.
Fim de Linha
Brechas na legislação associadas a deficiências do serviço de transporte regular e de infraestrutura levaram à pulverização da demanda e desencadearam, consequentemente, uma das mais severas crises dos últimos quatro anos na operação das empresas de ônibus. Situação que, segundo o setor, emperra os investimentos nas melhorias tão cobradas por quem usa os coletivos em seus deslocamentos diários.“A retenção e a falta de prioridade no transporte público elevam o custo do sistema. Eu posso ter cobertura dos custos diminuindo, ou seja, desonerando eles. Senão acontece como agora, a idade média da frota subindo, a última renovação foi há mais de dois anos. Essa falta de investimento no setor quem sente é o usuário na conta”, disse o presidente do Setransp, Alberto Almeida, ao F5 News em março de 2018, ao justificar o pedido de reajuste da tarifa que só foi concedido nove meses depois .
Cobrador há nove anos, Washington Batista elenca as razões pelas quais também opta pelo transporte coletivo quando não está de serviço. “Além de ajudar a desafogar o trânsito, ele é integrado, ou seja, não é como em outras cidades que tem que pagar várias passagens para chegar a algum lugar”, considera.
Roseane dos Santos Ribeiro, vendedora ambulante no Terminal de Integração do Distrito Industrial de Aracaju, na zona sul da capital, é outra usuária que enxerga o transporte público como meio mais viável para a mobilidade.
“Uso duas, três vezes no dia toda a semana, tanto para ir ao comércio, vir ao trabalho e ir para casa, sempre de transporte público. Hoje em dia está muito caro ir com outro transporte. Claro, ainda são necessárias muitas melhorias, mas o ônibus é um meio de transporte que facilita muito a vida de quem precisa, assim como eu”, relata Roseane.


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